MOVIMENTO LEGITIMISTA PORTUGUÊS
CONFUSO E MONÁRQUICO
O autor já não carece de apresentação!
Comentário ao post Confusões Monárquicas de Miguel Castelo Branco, no Combustões
Um dos mais respeitados bloggers (ou blogueiros) monárquicos em Portugal, MCB é também um dos mais representativos propagadores do monarquismo constitucionalista liberal em Portugal. As suas ideias partem da crença na lei de Thiers (reign but doesn't rule), na democracia enquanto principal método de decisão política, na limitação no sentido cartista dos poderes do rei, tudo critérios para a construção de uma Nova Monarquia que são partilhados por outros bloggers monárquicos portugueses. Por exemplo, no Livre e Leal Português, o liberal Aguiar Santos desenvolveu, com princípios análogos, a teoria do neocartismo para a criação de um estado constitucional minimalista e monárquico, admitindo que era essa a intenção dos criadores da Carta Constitucional. Vários outros sites e blogues monárquicos argumentam a questão de sucessão e governo usando como modelos a lei da Carta. Do lado minoritário tradicionalista, aquele que MCB afirma ter emparedado as possibilidades da monarquia, insiste-se em estudos aturados de toda a história institucional portuguesa e das suas leis antigas. Para o argumento de o tradicionalismo ser reducionista, não existe melhor contra-argumentação. O tradicionalismo insiste em aprender a verdadeira essência na origem e não na ideia nebulosa da origem.
Aquilo que separa um monárquico tradicionalista de um liberal é a mera percepção da realidade, e essa é, de facto, minoritária: a transição para uma monarquia parlamentar é tão difícil e inviável, no seio da actual constituição, como a criação de todo um regime. Não é através da mera destruição de uma cláusula relativa ao artigo 288º que se quedam retirados todos os obstáculos à criação de uma instituição monárquica. Mesmo ultrapassados esses problemas, após desvirtuado todo o documento constitucional e criada uma maior confusão de conceitos para os juristas que a Constituição como está já lhes traz, nada muda. Os mesmos problemas institucionais, as mesmas questões que se repetem desde a Monarquia Constitucional permanecem. De facto, MCB e o Estado Sentido, os monárquicos liberais da frente de batalha, por tanto comprometimento com a sua causa, começam por endeusar os 60 anos de Monarquia - 60 anos impostos aos povos destes reinos, pela sua humilhação durante as Guerras Civis e a Patuleia, pela destruição do sistema de "poderes entre poderes" que nos governava desde a era medieval e que permita Deus não esteja irremediavelmente perdido para sempre - esquecem que os mesmos problemas de base afligiam a Monarquia Constitucional: excessivo funcionalismo estatal, incompetente e excessivo dirigismo económico, desprotecção do cidadão perante novas modas jurídicas, influência do grande negócio sobre os governos e consequente sofrimento do pequeno proprietário ou proletário, etc. Os mesmos problemas de base devido ao incentivo do individualismo e do democratismo, do capitalismo de grande empresa, da reduzida liberdade dos povos para produzir e reter os proveitos dos seus ganhos, etc. O liberalismo constitucional, em Portugal e em Espanha, contribuiu sempre para criar Leviatãs disformes, gigantescos e frios, sem misericórdia. MCB afirma que a história favoreceu as monarquias de Thiers. Talvez neste século, e por sorte. A verdade é que, ao longo da segunda metade do século XIX e inícios do seculo XX, o único país de cultura católica com um sistema de governo monárquico e dotado de estabilidade era a Tradicional e Medieval Áustria-Hungria, estado esse que tinha o PIB em maior crescimento de toda a Europa da altura, e em rico desenvolvimento económico. Assente nas infra-estruturas herdadas pela sua Tradição, alterando de acordo com os ventos de reforma sempre que necessário, a Áustria-Hungria era talvez a monarquia que conferia mais liberdade de acção coerciva do Estado aos seus súbditos em toda a Europa. A pena de morte foi sentenciada apenas uma vez no espaço de tempo previsto (e foi em tribunal militar), enquanto que todos os roubos e furtos superiores a 30 libras, na livre Inglaterra, eram punidos com o garrote.
A ideia de uma monarquia limitada e tradicional com âmbito ideológico contrário ao demo-liberalismo ser uma utopia é uma ideia que pode ser refutada no plano histórico. A legitimidade da actual monarquia espanhola foi-lhe reconhecida pelo caudillo Franco. A ser feita por um governo revolucionário - o que seria muito improvável - Juan Carlos já teria sido feito refém, há muito tempo, de uma trama esquerdófila que o usaria como fantoche, o que tantas vezes aconteceu nas monarquias asiáticas e ainda acontece. Aliás, o que aconteceu, precisamente, durante a nossa Monarquia Constitucional.
MCB afirma que nunca existiu a mono-arquia. Eu afirmo o contrário. A arché existiu em Portugal - a origem do Poder, o início, a emanação da Soberania, a causa primeira da governação. E era mono- estava concentrada na Pessoa do Rei. Se os Integralistas exageraram em certos pontos a distribuição dos poderes, nunca perderam a razão quando afirmaram que todo o poder emanava do Rei: o problema está no facto de o demo-liberalismo ter alterado essa concepção de poder. Nos tempos pré-revolucionários a lei era uma emanação directa da vontade do rei - que nunca o fazia sem conselho de especialistas e académicos competentes - mas não era a fonte primária de direito, nem havia sequer a noção de fonte secundária. O poder real não se imiscuía nos negócios da Igreja nem da Família: não designava bispos (apesar de ter tido o direito de os propor) nem educava os filhos dos homens. A diversidade de instituições jurídicas era maravilhosa: de acordo com o Professor A. M. Hespanha só havia juízes-de-fora em 20% dos concelhos, e alguns possuíam direitos tão fortes que podiam impedir uma inquirição por parte dos poderes centrais. O costume da pátria era protegida pelo seu Pai - a sociedade era paternalista: Deus-Pai para tudo e todos, o Papa para a Igreja e para as almas, o Rei para a Respublica e o Pai na Família. O estado não era uma construção partidária nem de vontades: é contra isso, e não pela reconstrução do que foi destruído, que os miguelistas, legitimistas, integralistas lutam.
Se os modernos cartistas vêem nestes estudos apenas um saudosismo levado ao extremo, enganam-se: é através do estudo da história e do direito dos antigos que percebemos os moldes que eles usaram e que podemos criar uma alternativa viável ao demo-liberalismo, ao liberalismo sectário. Os Integralistas contribuíram nobremente para essa demanda, e constituíram a única alternativa séria, jovem e batalhadora, a dois sistemas podres: a República Parlamentar e a Não-Monarquia Liberal.
Quando monárquicos tradicionalistas afirmam, em várias línguas, que o Monarca tem de ter poder de decisão sobre as várias esferas do Poder: executivo, legislativo e judicial, não propõem um Führer coroado: a decisão real tem e deve ser a última em todas as questões. A sua pessoa deve, também, ser responsável e portanto livre - a cláusula de Benjamin Constant da irresponsabilidade do rei apenas contribuiu para o descrédito da instituição monárquica na discussão académica e ajudou a que se solidificassem as tentativas totalitárias dos governos liberais.
A Nova Monarquia por quem lutam, há tantos anos, os monárquicos como MCB é um nado-morto, um nada de glória vã. Acabará por ser uma instituição de cariz monárquico hereditário completamente vazia de conteúdo, procurando através de uma simbologia oca relacionar-se com algo que a suplanta mil vezes. A monarquia fantoche inglesa e espanhola e nórdicas parecem ser os modelos a seguir - é uma triste ilusão achar que se pode importar instituições que apenas se mantiveram devido à benevolência da história - é trocar má capa por mau capelo. Neste assunto importa absolutamente a doutrina de Chesterton - afirmar algo como "Tudo pela minha Mãe, mesmo que ela seja uma degenerada alcoólica" é escapar completamente à essência do problema. Reduzir o esforço dos integralistas a mero saudosismo é repudiar a obra de António Sardinha, que estudou a fundo o impacto sociológico das instituições demo-liberais na sociedade, e de Cabral Moncada, um jurista que, antes de ser um talentoso académico e pensador, concordou com o seu contemporâneo Erik von Kuehnelt - Leddihn quando estudava o impacto do partidarismo na sociedade e na protecção da liberdade.
A Nova-Monarquia das Reais Associações e Juventudes Monárquicas é uma velha oligarquia coroada, com tendências oclocráticas nas horas de reavivar a "legitimidade democrática" e entalar o Chefe de Estado na obrigatoriedade de acatar as ordens dos ministérios. No final de contas, a irresponsabilidade do rei tornou-o naquilo que era: uma mera ficção. Não foi a Carbonária a matar o Rei Dom Carlos e o Príncipe Real: a causa de morte destes dois desafortunados precede o seu próprio nascimento, e a arma que os matou era uma arma invisível, e não somente as carabinas do Buíça e do Costa: essa arma era a Carta Constitucional, e foi engatilhada pelo Imperador do Brasil.
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Manuel Pinto de Rezende
Bibliografia:
- The Menace of The Herd, Erik Ritter von Kuehnelt-Leddihn
- Liberty or Equality, Erik Ritter von Kuehnelt-Leddihn
- Textos de Filosofia Política, Cabral de Moncada
- The Economic Rise of the Habsburg Empire, David Good
- Ortodoxia, Chesterton
MPR
Publicada por Joaquim M.ª Cymbron em 05:52
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