O problema do liberalismo

A liberdade foi o último dos grandes problemas metafísico, que jamais interessou aos pré-socráticos. Mesmo Plotino (um neo-platónico) não escreveu uma linha sequer sobre o assunto. A questão começa a ser problematizada pela conversão religiosa, primeiro de São Paulo e depois de São Tomás de Aquino. Conquanto, a liberdade interior, prosseguida pela filosofia, desde a Antiguidade, até ao século XIX, passará a ser concebida pelo indivíduo moderno como um desejo de expandir a sua individualidade face à sociedade que vê ameaçar esse desejo. Forma-se aqui a partícula que enformará o pensamento humano por mais de um século: o liberalismo.

Principiando a problemática, a crise do liberalismo arranca a partir de pressupostos intelectuais sujeitos a doutrinas abstractas que visam transformar o mundo e combater a natureza do homem. Acontece que esse liberalismo tem vindo a afastar-se de qualquer conceito metafísico capaz de o enformar e dar sentido, um arrimo necessário para pensar o homem, então rebelou-se e caiu na perdição completa. As políticas, económicas e sociais que propugna separam o homem de qualquer concepção sobrenatural, moral e Divina, não podemos olhar tal ideia a não ser enquanto filha desnaturada da Igreja.

Entretecido pelas contradições que o enformam e o deformam não supera o risco de um pensamento débil, um vazio que o século passado tratou de demonstrar. Destarte, o liberalismo procura a causa histórica e específica do mal social e da corrupção moral, permitindo uma generalização básica e radical desse mesmo mal. Ao repudiar toda a metafísica do pecado original e ao proclamar a absoluta autonomia intelectual, social e moral, esse liberalismo nega a Deus e toda a religião, no lugar Dele coloca a "humanidade", essa entidade que Joseph de Maistre dizia nunca ter encontrado, ou conceito de tal forma vago e abstracto constatado por Gassett quando o mesmo dizia que "invocar a humanidade é demagogia", no fundo um apelo das massas.

Não significa que o ideal procurado pelo liberalismo não fosse bom ou nobre, na senda da abstracção das ideias e no plano das idealizações humanas talvez o fosse, desculpabilizando algumas insuficiências e as vastas contradições. Mas desnaturou e tornou-se o arcanjo renegado e caído no inferno. No fundo brilha pela generalização empírica dos efeitos corruptores do poder político, melhor ilustrado na velha máxima de Acton que "todo o poder corrompe", aquilo que para os marxistas é um "poder de classe". Caracteristicamente ataca todas as formas de autoridade e vê o Estado como um "mal necessário", mas torna-se incapaz de fornecer um código moral que separe o bem do mal, limitando-se a abandonar o homem à sua própria liberdade. Diferentemente, para o catolicismo a liberdade começa dentro da família e não na sociedade (socialismo) ou no individuo (liberalismo).

Mas, o liberalismo, ao atribuir a soberania ao homem, em virtude da qual deve reconduzir à igualdade natural toda a desigualdade, vai desmantelar todas as influências pelas quais os homens agem uns sobre os outros. Por fim, ignora o que o homem fará com a sua liberdade natural. Como consequência dessa procura pela emancipação humana vai implicar uma ruptura como desde os tempos romanos jamais acontecera, incapaz que foi de retomar o fio da trindade romana tradição-religião-autoridade rompida desde a senda humanista à reforma protestante.

O axioma da filosofia moderna começa nas premissas com que confronta a própria natureza do homem, ao basear-se numa teoria dos valores em que a axiologia passa a ser distinta do ser, enquanto o valor e o valer surgem como fenómenos particulares de uma mesma realidade, entra em rota de colisão com os próprios postulados.

Em suma, a filosofia moderna (que será o embrião dos "ismos" todos conhecidos) procurou rejeitar toda a metafísica, mas na verdade esta tendência nem sempre foi a regra, apenas a renovaram por caminhos tortuosos, exemplo decalcado na divinização do homem ou na concepção de ideologias assemelhando-se a religiões laicas com tendências totalitárias que, nas palavras de Tocqueville, reduzem os homens a pequenos bichos.






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