O Reaccionário
Cruzado sou

Cruzado sou. Envergo uma couraça,
Jurei meus votos num missal aberto.
– eu me persigno em nome do Encoberto.
Alto, bem alto, quando a lua passa,
a lua me dirá se o avisto perto.
Eu me persigno – ou seja noite baça,
ou rompa o dia, com o sol desperto.
Meu S. Cristóvão, de menino ao ombro,
ó Portugal, – eu me comovo e assombro –
nas tuas mãos ergueste o mundo inteiro.
Entrei por ti na religião da Esperança,
Pois na alvorada que de além avança,
vem tu vestir-me o arnez de cavaleiro!
António Sardinha in Pequena Casa Lusitana.
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Portugal Crucificado

Crucificado sobre um alto cerro,
com moiros a jogar-lhe a roupa aos dados,
eis Portugal pagando o antigo erro,
eis Portugal penando os seus pecados.
Insultam-no de baixo com aferro
esses a quem o insulto fez medrados.
Hora de expiação. Um ar de enterro
tingiu de treva os longes carregados.
E exclama Portugal: – «Senhor! Senhor!
A mim, alcaide-mor da Cristandade,
assim me abandonaste na agonia!»
António Sardinha
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Viriato

Deus fez a Terra. E a Terra fez a Raça,
Da Raça e mais da Terra tu vieste.
(O barro anónimo incarnou por graça
e a treva encheu-se dum clarão celeste!)
P'ra trás de ti há só a névoa baça,
há só a argila que o teu corpo veste,
parente das raízes, em quem passa
toda a rijeza duma noite agreste!
Porque és ajuda e segurança antiga,
pode bem ser que a tua voz consiga
guardar dos lobos o revolto gado...
Erguido sobre os longes pardacentos,
ó filho das levadas e dos ventos,
acode ao teu rebanho tresmalhado!
António Sardinha
Publicada por O Reaccionário em 15:07 0 comentários
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