O que é a Política


Frederico de Castro
(Adaptado das Jornadas de La Reja 2011)




São Luis de França mediando um conflito entre dois monarcas

Os estudiosos faz tempo tentam definir a política de diversas formas. Uns considerando-a arte, outros ciência, outros dizendo que há nela ambos os aspectos. Mas a política, nós podemos dizer com bastante segurança, é um conjunto de ações voltadas para o atendimento de uma finalidade teleologicamente fundamentada por uma ideologia ou por uma crença, sendo sem dúvidas parte de um conhecimento prático. Há na política um aspecto “arquitetônico” em tudo quanto diga respeito ao planejamento de um regime político, pois cuida-se de ordenar as ações do governo ao bem comum.

Dito de outra forma: por que nos interessa a política? Devemos nos interessar pela política? Eis que se trata de uma pergunta retórica, evidentemente, mas não inútil, certamente.
Partimos da constatação quase evidente de que o homem é um animal social. Ora, dizer tal coisa é uma verdade (embora nos momentos mais escandalosos do Iluminismo até mesmo isso tenha sido objeto de dúvida), mas de longe não é suficiente para explicar a política ou o interesse que se deva ter por ela.
Se assim é, talvez a resposta esteja no fato de que o homem organiza a sua sociedade. Mas isto ainda não é o que desperta o interesse pela política, pois também a organização social não é suficiente para explicá-la. Com efeito, diversos animais além do homem vivem agrupados e alguns chegam mesmo a ter alguma espécie de organização social, sendo que alguns desses agrupamentos são bastante mais “disciplinados” (obviamente não se trata de verdadeira disciplina, visto tratar-se de movimentos do instinto) do que os agrupamentos humanos.
Nesse exato sentido, é necessário notar que a organização dos agrupamentos das outras espécies de animais possui uma característica singular que será realmente a nota distintiva delas com relação à espécie humana: nas demais espécies a organização é sempre a mesma. Verdadeiramente, não existem duas colmeias de abelhas organizadas de maneira diferente, ou não existem diferenças substanciais entre duas manadas de búfalos, e assim por diante.
Por sua vez, a sociedade humana não se organiza de igual maneira – ainda que se escolha um mesmo regime político, sendo exatamente este o ponto que mais interessa à política. É preciso, pois, que se entenda que o homem vive necessariamente em sociedade, mas organiza diferentemente as sociedades em que vive.
Essas diferenças decorrem exatamente das faculdades do homem que implicam sua liberdade. Ao contrário dos animais, o homem é livre para organizar-se em função de sua própria espécie. Mas a questão que se impõe é: Pode a sociedade organizar-se impunemente?
Para responder a essa pergunta, vamos deitar nossa atenção sobre a política contemporânea.
Quanto à política – e o pensamento moderno não se dá conta disto –, é preciso reconhecer que se trata de uma ciência normativa e prática, mas, em sentido contrário, o pensamento moderno a entende como uma ciência meramente descritiva, devido à sua má compreensão do que vem a ser a própria liberdade. Isso é fruto do relativismo que surgiu a partir do ocaso da Idade Média.
Portanto, desde já podemos identificar um problema sério: o enfrentamento da política como uma ciência descritiva (fruto de um pensamento relativista). Quais seriam as implicações? Diversas ações que contrariam a realidade.
Com efeito, o pensamento moderno tem origem no desconhecimento de diversas verdades metafísicas (ou em um deliberado desafio a essas verdades). Enquanto o pensamento moderno, nas ciências exatas, ou ciências duras, deposita um rigoroso cientificismo – quase dogmático –, nas ciências humanas há como que um divórcio quase completo com a realidade.
Verdadeiramente, a violação dos princípios de uma ciência prática implica inexoravelmente alguma espécie de degeneração, pois se trata, repita-se, de uma negação em algum grau da realidade. Portanto, da mesma maneira que é impossível, ou pelo menos inviável, planejar um avião sem asas, é impossível ou é inviável admitir uma sociedade que se fundamente em algo alheio aos princípios do conhecimento prático.
A atual ciência descritiva impropriamente chamada “política” nos dias de hoje implica a criação de caricaturas sociais pela simples desatenção a princípios fundados em conhecimentos práticos, pois termina por se voltar contra a própria natureza humana.
As ciências práticas – assim como a verdadeira política – devem estar voltadas para o bem-estar, para o bem comum, mas hoje em dia têm sido reduzidas a uma espécie nominalismo (ou seja, filosofia que nega a qualquer possibilidade de conhecer as circunstâncias da realidade e finca no mundo o reinado da opinião). Ora, como se vê, trata-se de uma escandalosa fuga da realidade.
Logo, à pergunta proposta (pode a sociedade organizar-se impunemente?), a resposta só pode ser negativa, pois, como se pode perceber, a sadia organização social está diretamente vinculada a princípios práticos conectados à própria realidade. Se a política é a mais nobre de todas as tarefas humanas e a principal das ciências práticas, sabemos bem que a corrupção do melhor é justamente o pior. Reduzir a política a uma filosofia nominalista é, portanto, um suicídio social.
Posto isso, e dado que a política, como mostramos, é um conjunto de ações voltadas para o atingimento de uma finalidade fundada numa crença e que se fundamentam em conhecimentos práticos, somos obrigados a reconhecer que tal finalidade e tal crença não podem estar divorciadas da realidade. Mas é exatamente isto o que ocorre nos dias de hoje, muito em função da avidez de poder e de dinheiro. Eis, portanto, as razões que sustentam e justificam o interesse que se deve ter pela política: justamente evitar a corrupção do que é ótimo.

SEMINÁRIO PERMANENTE DE ESTUDOS SOCIOPOLÍTICOS SANTO TOMÁS DE AQUINO - SPES: O que é a Política