A DESCOBERTA DA AUSTRÁLIA PELOS PORTUGUESES
Por J. Chrys Chrystello
The Yawuji Barra and the Yawuji Baía
(Os Avós de Barra e os Avós de Baía)
INTRODUÇÃO - O CONTINENTE-ILHA
A Austrália caracteriza-se basicamente por ser um vasto continente de 8 000000 km quadrados de baixo-relevo orográfico, isolada, com suas terras áridas, bem diversa doutros locais do globo. O seu isolamento de outras massas de terra, explica até certo ponto a sua fauna e flora, enquanto o relevo pouco pronunciado se poderá atribuir à erosão do vento, das chuvas, e do calor durante as épocas geológicas em que a massa continental esteve acima do nível médio das águas. Para muitos, a Austrália foi a última fronteira, a última das terras, por ter sido das últimas que foram "descobertas" pela civilização ocidental… Dezenas de milhar de anos antes das viagens de Abel Tasman e James Cook ao Pacífico Sul, já os aborígenes haviam coberto a distância que separa a Ásia da Austrália, tendo-se disseminado pelo continente e pela Tasmânia, enquanto não falarmos das digressões portuguesas pela área...
O início daquilo a que muitos chamam a nova era civilizacional, poderá situar-se em 1788, aquando da chegada do Capitão Arthur Phillip, da Real Marinha Britânica (e comandante supremo do Almirantado Português na América do Sul), à frente da 1ª Armada, quando na época existiam cerca de 300 mil aborígenes mas não foi Cook quem deu o nome a esta terra.
FLINDERS DEU NOME À AUSTRÁLIA
Quem baptizou este continente? Decerto não foram os Portugueses pois que nos seus mapas aparece ainda a designação de Java a Grande (Jave, la Grande), essa Terra Australis que eles negavam veementemente conhecer e ainda hoje se recusam a reconhecer.
Durante mais de 30 anos após o histórico dia 26 de Janeiro de 1788, data do desembarque da 1ª Armada, ela foi conhecida pelo seu nome em Latim, de "Terra Australis" com o cognome de Incognita, mas também era denominada como Nova Holanda em honra dos navegantes holandeses que durante o século XVII arribaram à inóspita e árida costa do noroeste; ou ainda Nova Gales do Sul, tal como a baptizara o Capitão Cook para toda a metade oriental, ou ainda Terra de Van Diemen (Van Diemen's Land) nome dada à Tasmânia pelo navegador holandês daquele nome ouve porém um homem que lhe acabaria por dar um nome único a fim de terminar com a confusão de todas estas terminologias, um oficial da armada, navegador e explorador e hidrógrafo extraordinário com o nome de Matthew Flinders. Ele e o seu colega George Bass, um cirurgião naval com quem partilhava um amor ao mar e um interesse apaixonado na exploração de lugares distantes, exploraram e mapearam em conjunto e separadamente uma grande parte da costa australiana durante os finais do século XVIII e início do século XIX. Eles estavam de tal forma embrenhados no amor ao mar, a crer num dos seus biógrafos (Robert Osbiston), que deixaram as suas noivas de três meses para partirem em mais uma viagem. Flinders não tornaria a ver a sua mulher durante nove anos, dos quais sete passados numa prisão nas Maurícias. Bass nunca mais viu a sua mulher, pois que juntamente com a sua tripulação desapareceu na vastidão do Pacífico Sul, para nunca mais serem vistos nem ouvidos.
Flinders nasceu em Lincolnshire, na Inglaterra em 1774, e não acedeu aos desejos da família para ser cirurgião, tal como seu pai, avô e bisavô. Inspirado pela obra Robinson Crusoe já sabia que rumo ia dar à sua vida e aos 15 anos (1789) embarca como aspirante da marinha real, tendo maravilhado os seus superiores a bordo HMS Scipio com os seus conhecimentos de geometria e de navegação, dado ser muito novo e evidentemente autodidacta. Nos finais de 1790, Flinders juntou-se ao célebre Capitão Bligh (da famigerada Bounty e mais tarde Governador de Nova Gales do Sul) na sua segunda viagem ao Pacífico Sul, com o fim de transplantar fruta-pão das Índias Ocidentais.
Regressou a Inglaterra em 1793 e no ano seguinte alistou-se no HMS Reliance, então a aprestar-se em Portsmouth, para embarcar como passageiro sob o comando de John Hunter, recentemente nomeado governador da nova colónia. Foi nesse navio que conheceu George Bass. Pouco depois de chegarem, em Setembro de 1795, os dois amigos fizeram-se ao mar com um miúdo como tripulante do barco Tom Thumb, um barquito com uma quilha de 8 pés (aprox 2,4 metros) e um mastro de 5 pés (1,5 metros), para fazerem descobertas ao longo da costa sul de Port Jackson. Exploraram a baía de Botany e o rio Georges, depois numa segunda viagem no "Reliance" passaram pela ilha Norfolk e mais para sul na costa pelo Lago Illawarra e Port Hacking.
FRANCESES NA AUSTRÁLIA
Não é só a descoberta portuguesa da Austrália, ou o nome de quem a baptizou que são desconhecidos. Ignorado também é o facto de em 1772, o navegador francês François Saint-Allouarn ter ancorado o seu barco "Gros Ventre (Barriga Grande) " em Shark Bay (A Baía dos Tubarões), mesmo a meio da costa ocidental australiana (Nova Holanda ou Gonnevilleland como os Franceses lhe chamaram), e plantando a bandeira emitiu uma "prise de possession (título de posse) " para o seu soberano rei Luís XV, enterrando uma garrafa na ilha Dirk Hartog. A reivindicação era válida. Saint-Allouarn morreu no regresso a França e Luís XV demasiado ocupado com a guerra pelas possessões Franco-Canadianas, pode não ter dado conta da reivindicação.
Os Franceses planeavam ocupar as ilhas Rottnest e Garden (ao largo de Perth), também designadas como as Ilhas Napoleão, mas decidiram não manter uma fronteira comum com a Inglaterra. Napoleão apoiou uma expedição científica aos antípodas em 1800 liderada por Nicolas Baudin e a Austrália Ocidental voltou à posse de Inglaterra em 1829, assim como Les Malouines (Falkland ouMalvinas) o tinham sido 65 anos antes. A Terra Australis tornou-se assim em mais um acidente da História Anglo-Saxónica que latina.
A ligação da França e da Austrália (apesar das divergências quanto às explosões nucleares em Mururoa) persiste ainda nos nossos dias. Metade das mortes australianas nas duas Grandes Guerras foi em terras francesas, especialmente no Somme. Em 1918, o Exército Australiano (que não era parte do ANZAC) ganharam uma batalha decisiva contra os alemães em Villers-Bretonneux em 25 de Abril, dia que se tornou Feriado Nacional como Dia dos ANZAC's. Existem peregrinações regulares às campas de mais de 35 mil australianos na Picardia. A cidade de Mazamet, perto de Toulouse é "mais australiana que francesa, e as suas companhias têm mais funcionários em Melbourne ou Geelong do que em Mazamet. As ruas chamam-se Melbourne, Yarra, Victoria, etc." segundo declarava Alain Serieyx que foi delegado geral da França para as celebrações do Bicentenário em 1988.
Austrália Ocidental evoca aquilo que o país poderia ter sido com os seus nomes franceses: Esperance, Bonaparte, Bossu, Naturaliste e Vasse. O livro "France Australe" de Leslie Marchant (Artlook Books, Perth, 1982) dá o crédito a Binot Paulmier de Gonneville como o primeiro europeu a andar em terras austrais, em 1504.
O navio Esperance, sob o comando de D'Entrecasteaux, fez uma viagem em 1791 da França até à Baía Botany em busca do desaparecido La Perouse. Numa curiosa ironia do destino, La Perouse tinha-se feito à Baía de Botany em 26 de Janeiro de 1788. O Governador Arthur Phillip tinha acabado de chegar com os degredados e colonos ingleses e ao vê-lo, mal teve tempo de hastear a bandeira inglesa. La Perouse é um nome importante na história australiana, pois enviou despachos e mapas das suas expedições do Pacífico, feitas a partir da Baía de Botany (na Sydney actual). O seu desaparecimento foi um mistério por mais de 39 anos.
Ainda hoje existe um monumento à sua memória numa área concedida aos franceses perpetuamente em 1825 (não era bem o que Napoleão queria, mas de qualquer modo era território legitimamente francês em Gonnevilleland). Aquele subúrbio, hoje território aborígene em grande parte, manteve o nome de La Perouse, nome também dado a um Museu na Baía de Botany, inaugurado aquando do Bicentenário (1988), e partilhando um edifício onde existe um controverso Museu Aborígene. Os franceses têm registos históricos dos seus múltiplos contactos com os aborígenes australianos, e os relatórios de François Peron e do artista Charles Leuseur evocam vívidas pinturas dos Tasmanianos que eventualmente pereceram sob o genocídio "europeu".
Conde de La Perouse, Almirante Jean François de Galaup, e as suas duas fragatas "La Boussoule" e "Astrolabe" ao chegarem ao porto da Baía Botany depararam com os 11 navios da 1ª Armada do Capitão Arthur Phillip. Estabeleceram contacto e viram Phillip partir para Port Jackson. Enquanto os britânicos faziam os preparativos para a sua instalação em Sydney Cove, os cientistas e marinheiros franceses descansaram por seis semanas na Baía Botany donde partiriam, de regresso a França em 10 de Março. Pouco depois as duas fragatas e os seus 230 homens desapareceram, sem deixarem rasto.
O mistério permaneceu até 1827, quando o navegador irlandês Peter Dillon encontrou a naufragada "Boussole" a dez metros de profundidade em Vanikoro, nas ilhas Salomão. Uns anos mais tarde também ali foi descoberto o "Astrolabe", que soçobrou no mesmo ciclone. Alguns relatos compilados por Dillon, dão conta que a maior parte dos náufragos foi comida por tubarões e alguns sobreviventes foram-no, mas pelos nativos que temiam que eles fossem espíritos malignos. Alguns sobreviventes demoraram entre 6 a 9 meses a construírem um barco de dois mastros, nos quais apenas dois sobreviventes terão embarcado. Os restos de uma embarcação como a descrita pelos nativos foram encontrados em 1861, perto de Mackay, no norte da Queenslândia.
Hoje, no museu de nove salas, que ostenta o nome de La Perouse, podem observar-se reproduções do primeiro encontro com os aborígenes, do encontro com o capitão Phillip; vendo-se ainda a exploração geral do pacífico depois da viagem de circum-navegação de Fernão de Magalhães e a história de La Perouse, desde o seu nascimento em Albi ao seu envolvimento na Guerra da Independência da América e a libertação dos portos de Hudson Bay das mãos dos ingleses. O Museu tem ainda relíquias da época que atestam os contactos amigáveis entre Sir Joseph Banks e La Perouse, e reproduções diversas da época.
Quando em 1984 se publicou o livro de Colin Wallace "The Lost Australia of (A Austrália Perdida de) François Peron", imaginava-se que se iria reacender a controvérsia do século XIX sobre a nomenclatura da costa australiana: naquela época a costa meridional ostentava nomes como TerreNapoleon, Golfe Bonaparte, Golfe Josephine. A própria Ilha Kangaroo (Canguru) foi baptizada por Nicholas Baudin como "Iles Decres" e a Baía Encounter (Encontro) ficou denominada assim por ter sido o ponto de encontro acordado por entre François Peron e Matthew Flinders. O interesse da França por estas paragens, de acordo com aquele livro de Colin Wallace, cresceu a partir da
expedição no século XVIII de Louis de Bougainville, antes da Revolução Francesa e da Era de Terror que se lhe seguiu. Napoleão nutria um fascínio secreto pela Austrália, notável, pois enquanto preparava as guerras no continente ainda teve tempo para se dedicar a montar uma expedição científica aos antípodas. Peron tinha qualidades de liderança notáveis, demonstradas durante a Revolução Francesa e as guerras Prussianas, tendo sido promovido a sargento antes dos 20 anos. Gravemente ferido ficou incapacitado, o que não o impediu de frequentar a escola médica da Sorbonne onde estudou ciências médicas, tendo-se oferecido para a expedição como cientista. Quando Baudin faleceu nas Maurícias, foi ele que assumiu o comando da expedição que durava há já quatro anos. Peron, em Paris, conseguiu classificar as colecções de botânica e zoologia, para além de publicar o relato da expedição, mas morreu de tuberculose aos 36 anos de idade. Uma das curiosidades deste livro é que ali Peron aparece como o primeiro ecologista, alertando para o perigo de extinção de plantas e animais que então considerava raros e em vias de extinção.
Outra curiosidade, aparte as considerações sobre a incompetência de Baudin como comandante de uma missão desta importância, é a de Peron ter sido o "pai da antropologia" e o seu estudo dos aborígenes em diversas partes da Austrália, assim o atesta. Ele dava-se bem e gostava deles e, muito do que hoje se sabe sobre os desaparecidos aborígenes da Tasmânia, a ele se deve. Peron é também o primeiro a ter comido carne de "wallaby (pequeno canguru) " que estava confiante poderia ser criado como animal doméstico, descrevendo a sua carne como semelhante à dos coelhos da sua terra natal. Peron morreu demasiado cedo (1810) para que a sua valiosa obra científica tivesse a consideração merecida e, em vez de termos hoje alguns nomes franceses na costa australiana, decerto teríamos muitos mais.
http://www.dightonrock.com/adescober...pelosportu.htm
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