A Colonização Portuguesa
Texto de José Pinheiro da Silva.
Todas as culturas e civilizações de alta nobreza, ocidentais ou orientais, têm como característica comum a aptidão da expansão. Nenhuma é estática. As civilizações mongol, chinesa, helénica, latina, pré-colombianas (aztecas, maias, incas, etc.) tiveram o condão de se expandirem por vastos territórios, assimilando os povos que encontraram onde quer que estanciassem. Como se sabe, somos dignos herdeiros da romanização - vasto e profundo movimento de colonização, que permitiu o surgimento do pujante Império Romano, de que a Ibéria era uma das suas mais fecundas parcelas. As crenças religiosas, a língua, os usos e costumes, a miscigenação étnica, etc. são factores indispensáveis de assimilação e integração, filhos diletos da colonização.
De outra parte, só os povos de muito valor moral conseguiram, ao longo dos séculos, criar culturas e civilizações de relevância indubitável. A Europa é a bendita mãe dos melhores: Portugueses, Espanhóis, Ingleses, Franceses, Holandeses. Da sua acção colonizadora - que o mesmo é dizer civilizadora -, nasceram todas as actuais nações americanas, continentais e insulares, as pseudo-nações africanas a Sul do Sara, a Austrália, a Nova Zelândia,etc. Os europeus devem ter justo orgulho dessa actuação sem rival na História da Humanidade.
Só por ignorância ou má-fé se pode asseverar que a colonização é maléfica ou pecaminosa, visto como implica necessariamente a submissão duns povos por outros ... A colonização exige a promoção de povos de nível cultural e civilizacional inferior... Impõe ao colonizador deveres inalienáveis, de todos conhecidos, nos domínios da educação, da saúde, do desenvolvimento material dos territórios ...
Pensando bem, embora a assimilação seja património da Humanidade, aos portugueses cabe a inefável glória de lhe ter atribuído a distinção de princípio orientador de toda a sua grandiosa e inigualável acção ultramarina, de que a lusofonia, de que tanto falam os desavergonhados estrangeirados da actualidade, é apenas uma das suas magníficas consequências.
Entre nós, com efeito, a colonização, mercê da assimilação, enriqueceu sobremaneira o escol nacional com personalidades de valor indesmentÍvel, tais como Dinis Fernandes de MeIo, dilecto companheiro de Afonso de Albuquerque nas lides da Índia, Pe. António Vieira, orador sacro e prosador sem rival, o Marquês de Pombal, estadista insigne, o Aleijadinho, quiçá o melhor escultor luso; Gonçalves Crespo, Almada Negreiros, o Dr. Sousa Mastins, etc., etc .. Grandes nomes nas letras, artes e ciências. Note-se que houve ultramarinos de cor que mereceram ser elevados à alta categoria de Cavaleiros de Cristo: André Álvares de Almada, excelso guerreiro caboverdiano, Henrique Dias, herói da restauração de Pernambuco, por exemplo. A Luís Lopes de Sequeira, luso-angolano devemos a ocupação de boa parte do território a que demos o nome de Angola e que, nos idos da segunda metade do século XX era um dos mais desenvolvidos territórios da África sub-sariana ... Honório Barreto, nativo guineense, foi um dos melhores governadores ultramarinos e português de lei.
É de notar que Angola cedo adquiriu um alto grau de assimilação do pensar e sentir dos melhores lusitanos do Reino - o que, já se vê, denunciava o seu portuguesismo. Refira-se o facto de, nos alvores da independência do Brasil, Angola, pela voz da edilidade de Luanda, em que predominavam homens de cor, ter optado por Portugal, repudiando veementemente o convite brasileiro para que se juntasse ao Brasil. .. Angola, como se vê, preferiu continuar portuguesa ...
O Dr. Antero Simões, professor liceal, escritor de reconhecido mérito, publicou oportunamente em Angola, quando ali era Portugal, uma antologia intitulada "Nós ... somos todos Nós" - prova insofismável de que portugueses autênticos eram de várias etnias e naturais tanto da metrópole como do Ultramar ... Vale a pena lê-la e meditá-la.
Na Ásia há núcleos de descendentes de portugueses que muito se orgulham dessa qualidade e usam o "papiá cristão" - um linguajar de raiz portuguesa. Em Malaca dança-se e canta-se o vira ... Em vastas áreas dos bacongos, "brancos" são os portugueses, sendo os demais europeus apenas franceses, ingleses, belgas, etc., etc .. Nativos angolanos e cabindas apresentavam-se como portugueses em muitas regiões sub-sarianas. De resto, nos séculos dezoito e dezanove, muitos comerciantes sertanejos, os famosos "funantes" ou "pombeiros" - verdadeiros difusores da portugalidade - eram nativos retintos e euro-africanos, designados geralmente "brancos", talo seu grau de integração nos usos e costumes portugueses...
De resto, sabemos que os nossos reis consideravam portugueses todos quantos obedeciam às suas leis e se colocavam sob a soberania lusitana. Por outro lado, é bem nacional o curioso conceito cultural de etnia ou raça, segundo o qual português é quem pense, sinta e aja como bom metropolitano de pura cepa ...
A miscigenação étnica é indispensável à boa marcha da acção integradora. Em Portugal, como é sabido, acompanhou a gesta dos Descobrimentos e Conquistas. Começou no próprio Reino - a Metrópole da era republicana. O Brasil fez-se sob a sua bênção: os bandeirantes, heróis da expansão territorial da América Portuguesa, eram, em boa parte, luso-ameríndios ou mamelucos. O arquipélago caboverdiano é filho da miscigenação luso-africana, e ocupa lugar cimeiro na nossa cultura ...
Note-se que em Portugal nunca seria possível a hedionda política do "apartheid", tão do agrado de europeus moçambicanos. É que a génese do nefasto "apartheid" está no medo-pânico que se apossou dos brancos descendentes dos colonos holandeses, os farnigerados "boers", ameaçados de extinção através da miscigenação étnica ... Pretendeu-se, pelos vistos sem grande êxito, impedi-la pela violência e mil leis altamente pecaminosas ...
As orientações do pensar e sentir dos portugueses apontavam para a criação de sociedades multiétnicas. Só se entende bem a essência do nosso colono em certo meio - ia a dizer no seu meio natural-, no "mato", isto é, fora da cidade, mesmo da vila: nos pequenos povoados do interior, sendo mãe dos seus filhos uma nativa ou mestiça. O lar em que nasci era assim; conheci muitos e, porque fui chefe de posto administrativo num curto lapso de tempo embora, tive a vivência dessa amorável realidade de outro ângulo, não menos enriquecedor. .. Concordo plenamente com os sociólogos que opinam que o que distingue os portugueses dos mais colonizadores não é tanto a miscigenação étnica, de que nenhum povo está imune, mas a atitude frente ao mestiço ... Haja em vista nesta tese anglo-saxónica, à margem da antropologia, da genética, intrinsecamente racista: uma gota de sangue africano ou negro basta para que um anglo-saxónico seja africano. Por outras palavras: não há mestiços ingleses ou anglo-saxónicos ...
Gilberto Freyre é o egrégio sociólogo que melhor compreendeu e interpretou o sentido profundo da expansão portuguesa no mundo: o luso-tropicalismo, por si magistralmente concebido, é a melhor definição do ser nacional. Está a anos a luz duma utopia. Só o não aceita quem for absolutamente incapaz de apreender e sentir a essência da lusitanidade e da expansão portuguesa no mundo.
Desde os primórdios da inigualável e amorável gesta dos Descobrimentos e Conquistas, na remota centúria de Quatrocentos, entendeu-se que ali onde estanciasse gente lusa era também Portugal. Por isso, não há nada de novo na afirmação de que a nação portuguesa ia do Minho a Timor. Fazia parte do património histórico e cultural de Portugal. E é de salientar que se orgulhavam desse Portugal que ia do Minho a Timor; ninguém duvidava dessa magnífica construção do génio lusitano. Nos meus tempos de escolar de Coimbra, a vivência de sentimentos nacionalistas entre os estudantes desse Portugal imenso era inquestionável e comovente. Excepção aberta somente aos estrangeirados, poucos, felizmente ... Duvidar do que é português, combater tudo quanto enobrece a Nação é próprio dos filhos de Abril, anti-nacionais por excelência ...
É bom notar que na sua qualidade de portugueses é que ultramarinos de todas as cores epidérmicas e credos participaram, ao longo de séculos, em todas as actividades civis, militares e religiosas que nobilitaram deveras a nossa vida d' Aquém e de Além-Mar.
"Tudo lhes pertence e nos cabe, porque a Pátria não se escolhe, acontece. Para além de aprovar ou reprovar cada um dos elementos do inventário secular, a única alternativa é amá-la ou renegá-la. Mas ninguém pode ser autorizado a tentar a sua destruição, e a colocar o partido, a ideologia, o serviço de imperialismos estranhos, a ambição pessoal, acima dela. A Pátria não é um estribo. A Pátria não é um acidente. A Pátria não é uma ocasião. A Pátria não é um estorvo. A Pátria não é um peso. A Pátria é um dever entre o berço e o caixão, as duas formas de total amor que tem para nos receber."Cidade do Santo Nome de Deus de Macau, Não Há Outra Mais Leal
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