Abstenção invalida referendo sobre aborto em Portugal

Dom, 11 Fev, 08h24

Por Axel Bugge



LISBOA (Reuters) - O referendo sobre a legalização do aborto em Portugal, realizado neste domingo, foi invalidado devido à pequena participação dos eleitores, mas o tema agora deverá ser encaminhado ao Parlamento.

Com a contagem dos votos virtualmente concluída, mais da metade dos eleitores não foram às urnas, o que pela lei anula a consulta (é necessária a participação de pelo menos 50 por cento dos votantes).

Uma pesquisa de boca-de-urna realizada pelo canal estatal de televisão RTP e pela Universidade Católica mostrou que pelo menos 56 por cento dos eleitores não compareceram.

Referendo semelhante realizado em 1998 também foi anulado pela abstenção, quando apenas 32 por cento do eleitorado registrou voto.

Choveu o dia inteiro na maior parte do país neste domingo, o que contribuiu para desencorajar os eleitores.

Dos votos contatos, 59,3 por cento votaram para encerrar a proibição do aborto, enquanto 40,7 por cento pediram a manutenção do veto.

O primeiro-ministro socialista, José Sócrates, afirmou que apesar de o pleito ter sido invalidado, o resultado mostra que a vontade da maioria do país de forte tradição católica é pela liberalização.

"As pessoas mostraram isso claramente", disse Sócrates em um pronunciamento na televisão.

"A lei (que legaliza o aborto) será discutida no Parlamento. Nosso interesse é combater o abordo clandestino e nós temos que produzir uma legislação que respeite o resultado do referendo", afirmou.

O primeiro-ministro fez campanha pelo fim da proibição que, segundo ele, causa milhares de abortos ilegais a cada ano e que ele classificou de "a ferida mais vergonhosa de Portugal."

A campanha opôs, de um lado, os católicos desse país, um dos mais conservadores da Europa, e do outro, os jovens liberais urbanos, que esperavam que seu país tivesse uma legislação equivalente à da maioria das outras nações européias, que permitem a realização de abortos.

Se a proibição for mantida, Portugal continuará a ser um entre um pequeno grupo de países europeus -- Malta, Irlanda e Polônia -- que proíbem o aborto.

No Santuário de Fátima, ao norte de Lisboa, onde a Virgem Maria teria aparecido seis vezes a três crianças pastoras em 1917, católicos devotos rezaram neste domingo pela criança não nascida. "Nascidos pela vontade de Deus", diziam grandes cartazes com figuras de bebês colocados na frente do santuário.

"Votamos pela vida, que é a nossa obrigação", disse uma freira ao sair de um posto de votação perto de Fátima, o maior santuário católico de Portugal.

AMEAÇA DE CADEIA

De acordo com a legislação atual, as mulheres podem ser presas por fazerem aborto e há alguns anos, uma enfermeira que realizava abortos foi para a cadeia.

A mensagem da campanha pelo "sim", de que a legalização pode pôr fim aos abortos em péssimas condições, aparentemente funcionou para alguns eleitores.

"Votei sim e sempre votarei sim", disse Laurinda Duarte, a caminho da igreja. "Sempre haverá abortos, portanto por que não votar de forma a permitir que as mulheres os realizem em condições decentes? Sou católica, mas isso não significa que não tenha liberdade para votar."

Os liberais esperam que Portugal ponha fim a uma proibição que consideram antiquada.

Líderes católicos manifestaram preocupação com a possibilidade de que a legalização do aborto abra o caminho para o abandono de outros valores tradicionais em Portugal, o país mais pobre e um dos mais conservadores da Europa ocidental.

A campanha pelo "não" afirmou que o fim da proibição aumentaria o número de abortos e os custos públicos com saúde.

http://br.noticias.yahoo.com/s/reute...gal_aborto_pol