Viva a todos,
Li com interesse os comentários, tanto neste tópico como no "28% dos Portugueses...". Gostava de partilhar a minha visão sobre o tema.
Permitam-me desde já enunciar alguns pontos que creio serem essenciais na discussão, baseados na minha opiniãp mas também na leitura dos comentários.
1) Conceito de Pátria, e em especial o conceito de Espanha.
2) Conceito de "nacionalidades" Ibéricas, em especial a questão de Portugal vs. Leão, Castela, Catalunha, etc.
3) Relacionado com 2) a relação entre as práticas actuais e as suas consequências políticas (Qual a capital? Língua oficial? Televisão))
4) Proximidade (ou falta dela) entre "espanhóis" e portugueses.
5) Utilidade e motivação subjacente ao conceito de uma "Hispania" moderna.
1) Conceito de Pátria e de Espanha
Existe como é óbvio para todos uma diferença assinalável entre a forma como neste fórum se usa a palavra Espanha e como ela é usada hodiernamente, e em especial pelos Portugueses que aqui responderam negativamente á pergunta. É claro para mim que a esmagadora maioria dos frequentadores deste espaço consideram quando falam de Pátria e de Espanha o processo iniciado em 589 por Recaredo e que substanciou mais tarde a Recuperatio Hispaniae, sendo os vários Reinos que apareceram (e desapareceram) manifestações políticas individuais que existem de forma acessória sem desvirtuar o "objectivo" traçado no III Concílio de Toledo, que define uma Espanha composta sem dúvida de diferentes espaços culturais mas unida na sua essência pela génese comum que deverá ser reflectida numa reunificação política.
Para outros os conceitos de estado/pátria/nação assumem outras formas, umas dualistas (Portugal e Espanha), outras mais diversas (incluíndo a secessão de partes da actual Espanha enquanto conceito político).
2) Conceito de "nacionalidades" Ibéricas
Este ponto é fundamental para perceber uma parte das objecções por parte de Portugueses. Boa parte das explicações dadas por Espanhóis sobre a questão das nacionalidades equipara Portugal à Catalunha, Aragão, Galiza, etc., dando nitidamente a entender que a ideia é simplesmente que Portugal "assuma" uma posição semelhante. São dois os argumentos que penso fundamentarem esta posição:
- Que Portugal "não é mais" que os "outros", i.e. não é "diferente" das outras actuais comunidades autonómicas de Espanha.
- Que numa futura Espanha unificada baseada em Forais todas as garantias usuais (linguísticas, culturais, etc) estão garantidas, pelo que não há nada a alterar em particular no caso de Portugal.
Sobre estes pontos existe uma evidência óbvia que gostaria de salientar: que eu saiba o Castelhano é língua oficial de toda a Espanha e falada por toda a população (na pior das hipóteses como segunda língua). Como se chegou a esse ponto não interessa, mas tal é simplesmente inconcebível quando se fala de Portugal. É uma diferência assinalável e que coloca questões importantes, e que também serve de factor de diferenciação adicional. Para além disto é, creio, algo autista querer simplesmente apagar quase um milénio de história, com tudo o que isso implica.
Para os Portugueses dificilmente - diria mesmo de forma quase impossível - se pode conceber uma qualquer "Hispania" assente na aplicação indiscriminada do que se julga se bom para as comunidade autónomas espanholas a Portugal.
3) Questões práticas e administrativas.
Já se falou na língua, na capital, na televisão. Uma pergunta que foi feita merece resposta: há abertura para os que defendem a União Ibérica para que a língua "nacional" seja o Português, para que a capital seja em Lisboa (ou Porto, ou Coimbra, etc), que a televisão nacional seja difundida em Português com espaços para "línguas regionais"? Não que defenda que isto seja lógico, mas também não o é o oposto.
A haver uma União Ibérica teria, á semelhança da de Filipe II, assentar na equiparação absoluta nestas matérias, algo que não acontece na Espanha actual. E é aqui que a questão de Portugal "ser igual" ao resto se revela reductor, visto "o resto" ter pacificamente ou não aceite uma série de consequências que são simplesmente inaceitáves em Portugal.
4) Proximidade entre os povos Ibéricos
Já aqui li Portugueses que indicam ser mais próximos dos Italianos, e Espanhois a dizer sensivelmente o mesmo. Pessoalmente não me revejo nestas posições: todos os povos ibéricos partilham um sem número de afinidades óbvias, de tal forma que para mim estar em Espanha não é de todo estar no "estrangeiro". Seja como for é verdade que vários factorem contribuem para este sentimento de afastamento, incluíndo a forma como tradicionalmente se faz salientar o conceito de nacionalidade em oposição a Espanha, e no sentido contrário a ignorância no que diz respeito a Portugal por parte dos Espanhóis.
5) Utilidade e motivação para uma Hispania moderna.
Também se falou - e bem - de qual seria concretamente a utilidade e motivação subjacente a este projecto. Dentro dos que defendem no mínimo uma "concertação ibérica" existem duas posições:
- Que se trata de cumprir o desígnio original de 598, que quando cumprido permitirá a uma Espanha unificada erger-se uma vez mais sem interferências externas.
- Que em termos práticos nada aponta que tal União seja benéfica, visto que pouco traria de vantagens em comparação com uma política de concertação ibérica alargada (mas mantendo a separação política), e potencialmente poderia trazer inconvenientes e instabilidades dada a sensibilidade das populações.
E neste ponto me coloco, em dúvida. Se sou sem hesitação um defensor acérrimo de uma identidade Ibéria - seja, Espanhola, na verdadeira acepção da palavra - é acima de tudo na forma de a concretizar que se me colocam maiores dúvidas. Não porque ache que os Espanhóis nos queiram "anexar": não, pois como já disse alguém o problema não são os Espanhóis que não gostam dos Portugueses... o "problema" são os Espanhóis que de facto gostam dos Portugueses, e é por gostarem que esta questão se põe. E, aproveito para frizar, nem se devem falar de questões económicas e materiais, que são simplesmente insultuosas.
Saudações a todos, e as minhas desculpas pela extensão do texto.
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